27 ABRIL 2019

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50 anos de casados

domingo, 28 de novembro de 2010

O NOIVADO DO SEPULCRO

Com tanta "intelectualidade" que as minhas amigas têm manifestado ultimamente, já me conseguiram arrastar para o campo do "sério", onde não me apetecia nada mergulhar. Mas pronto, intumesceu-se-me a veia poética (reprodutora, não pessoal) e aqui vai uma balada de Soares de Passos que tive que decorar nos meus tempos de estudante e que pôs a turma inteira quase a soluçar após a minha "magnífica" recitação (se não sou eu a gabar-me...)

O NOIVADO DO SEPULCRO

Vai alta a lua! Na mansão da morte
Já meia-noite com vagar soou;
Que paz tranquila; dos vaivéns da sorte
Só tem descanso quem ali baixou.

Que paz tranquila!... Mas eis longe, ao longe
Funérea campa com fragor rangeu;
Branco fantasma semelhante a um monge,
D' entre os sepulcros a cabeça ergueu.
Ergueu-se, ergueu-se!... Na amplidão celeste
Campeia a lua com sinistra luz;
O vento geme no feral cipreste,
O mocho pia na marmórea cruz.

Ergueu-se, ergueu-se!... Com sombrio espanto
Olhou em roda... não achou ninguém...
Por entre as campas, arrastando o manto,
Com lentos passos caminhou além.

Chegando perto duma cruz alçada,
Que entre os ciprestes alvejava ao fim,
Parou, sentou-se e com a voz magoada
Os ecos tristes acordou assim:

"Mulher formosa, que adorei na vida,
E que na tumba não cessei d' amar,
Por que atraiçoas, desleal, mentida,
O amor eterno que te ouvi jurar?”

“Amor! Engano que na campa finda,
Que a morte despe da ilusão falaz:
Quem d' entre os vivos se lembrará ainda
Do pobre morto que na terra jaz?”

"Abandonado neste chão repousa
Há já três dias, e não vens aqui...
Ai, quão pesada me tem sido a lousa
Sobre este peito que bateu por ti!”

"Ai, quão pesada me tem sido!"
E em meio,
A fronte exausta lhe pendeu na mão,
E entre soluços arrancou do seio
Fundo suspiro de cruel paixão.

"Talvez que rindo dos protestos nossos,
Gozes com outro d' infernal prazer;
E o olvido cobrirá meus ossos
Na fria terra sem vingança ter!”


"Oh nunca, nunca!" de saudade infinda
Responde um eco suspirando além...
"Oh nunca, nunca!" repetiu ainda
Formosa virgem que em seus braços tem.

Cobrem-lhe as formas divinas, airosas,
Longas roupagens de nevada cor;
Singela c'roa de virgínias rosas
Lhe cerca a fronte dum mortal palor.

"Não, não perdeste meu amor jurado:
Vês este peito? Reina a morte aqui...
É já sem forças, ai de mim, gelado,
Mas inda pulsa com amor por ti.”

"Feliz que pude acompanhar-te ao fundo
Da sepultura, sucumbindo à dor:
Deixei a vida... que importava o mundo,
O mundo em trevas sem a luz do amor?”

"Saudosa ao longe vês no céu a lua?”

"Oh vejo sim... recordação fatal!”
"Foi à luz dela que jurei ser tua
Durante a vida, e na mansão final.”

"Oh vem! Se nunca te cingi ao peito,
Hoje o sepulcro nos reúne enfim...
Quero o repouso de teu frio leito,
Quero-te unido para sempre a mim!"


E ao som dos pios do cantor funéreo,
E à luz da lua de sinistro alvor,
Junto ao cruzeiro, sepulcral mistério
Foi celebrada, d 'infeliz amor.

Quando risonho despontava o dia,
Já desse drama nada havia então,
Mais que uma tumba funeral vazia,
Quebrada a lousa por ignota mão.

Porém mais tarde, quando foi volvido
Das sepulturas o gelado pó,
Dois esqueletos, um ao outro unido,
Foram achados num sepulcro só!

8 comentários:

  1. Ó Maria!!!...
    Mas que intelectualidade tão comprida...
    E tu fixaste isto tudo?
    Mas naquela altura usavam-se estes amores, hoje em dia ...já ninguém vai virgem para a tumba!...
    Mas era mesmo uma época de grande romantismo!!!
    No entanto,ainda bem que eu não era da tua turma...não consigo fixar nada, nem a "Menina das tranças pretas"...

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  2. Tambem digo o mesmo Stella.
    Ainda bem que não fui da mesma turma, pois sou um zero á esquerda, tudo o que seja para fixar de letras, está bem está...não vou lá.
    Se esta época volta as virgens fogem todas...já ninguem quer morrer de pureza...haahaha.
    Beijocas

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  3. Credo! Mas que intelectualidade tão tétrida!
    Mas não foste tu que escolheste o poema a decorar?
    Pergunto porque também passei por isso mas a escolha era livre, não era imposta. A minha professora desse ano era muito democrata...também foi só nesse ano.

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  4. Não me lembro se fui eu quem escolhi ou se me foi imposto. Sei que o decorei e que na altura o achava bem romântico e não tétrico (como tu querias dizer). Hoje em dia só sei de cor a primeira estrofe.

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  5. Agora fizeste-me lembrar o outro que dizia:
    "Estavas tão meditabunda, tão tétrica..." e mais não digo a menos que peças. eheheh

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  6. Eu também sei, por isso não peço...

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  7. Pois então peço eu, Vá diz lá Lucinha... Eu também tive de decorar e recitar vários, mas os meus preferido eram os de Camões. Muito mais bonitos e não tão lúgrebes....

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